Grandes consumidores industriais, conhecidos como eletrointensivos, não estão foram do risco de serem afetados com o apagão, apesar de estarem protegidos de adversidades no abastecimentos de energia elétrica. Isso porque, num caso extremo de apagão, não há para quem recorrer.
Caso se deparem com o pior cenário, existem alternativas para reduzir os prejuízos aos grandes consumidores
No geral, a autoprodução de energia funciona sob dois tipos de arranjos. No primeiro caso, da geração “in situ”, que são empreendimentos que aproveitam subprodutos do próprio processo industrial para fins energéticos. Segundo dados da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape), os autoprodutores, classificados como “in situ”, somam apenas 3 gigawatts (GW) de capacidade instalada pelo país, o equivalente só a 15% dos 20 GW contabilizados pela entidade junto a seus 16 associados, entre eles Alcoa, CSN, Suzano e Vale. Já outro grupo de empresas aposta na autoprodução remota, recebendo a energia pela rede.
Entre os autoprodutores, os únicos “blindados” são aqueles que possuem usinas ligadas diretamente no ponto de consumo, dispensando o uso do Sistema Interligado Nacional (SIN).
“Entendemos que há folga estrutural no sistema elétrico para suprir a demanda por energia este ano. Mas é uma situação preocupante para todo mundo, mesmo para o autoprodutor”, avalia Mário Menel, presidente da Abiape. “É mais tranquilo para quem produz com térmicas, com gás de alto-forno, como uma siderúrgica. Já as hidráulicas têm o risco hidrológico (GSF). Este ano estamos projetando um GSF de 75%, ou seja, 25% de redução em relação à geração prevista”, explica.
“Temos visto bastante demanda das empresas por estudos de viabilidade para se tornar um autoprodutor. Me pedem um leque de oportunidades”, conta Marcelo Ávila, vice-presidente da Comerc Energia. “Acabamos avaliando mais a modalidade ‘remota’, ‘in situ’ é mais complicado. Quem poderia fazer autoprodução local integrada ao processo produtivo, já faz.”
Apesar da preocupação crescente com o atendimento da demanda por energia neste ano, os grandes consumidores dizem que ainda não trabalham com o cenário de racionamento. Hoje, a grande preocupação é o preço da energia no mercado spot, o PLD, que não tem refletido as condições hidrológicas adversas.
“Nos últimos seis meses, passamos a maior parte do tempo com preços a R$ 100 por megawatt-hora (MWh), mas estamos com chuvas na pior média da série histórica. O preço deveria estar muito próximo do teto, em torno de R$ 500/MWh, mas os programas computacionais não estão calculando isso”, afirma Fillipe Soares, diretor técnico da Abrace, que congrega grandes consumidores do mercado livre.
Esse preço mais baixo traz um efeito negativo: por estar descolado do custo “real” da energia, acaba aumentando a conta do Encargo dos Serviços do Sistema (ESS). Segundo Soares, a indústria tem tido um custo adicional de R$ 40/MWh apenas com esse problema. “Existe uma incerteza de algo lá na frente [racionamento], mas tenho a certeza de que tem vindo uma conta enorme há mais de seis meses.”
Caso o pior cenário aconteça, alguns agentes já apontam alternativas para reduzir os prejuízos aos grandes consumidores e uma delas é a implementação de um programa organizado de “resposta da demanda” para a indústria. Funcionaria assim: grandes consumidores seriam incentivados a remanejar sua produção para horários de menor demanda por energia, retirando a pressão do sistema nos momentos de pico. Em troca, receberiam uma compensação financeira.
“Num quadro de racionamento, tenho certeza que isso seria crucial para resolver o problema de atendimento da demanda. Já do ponto energético, teria menos efeito, porque você deixa de consumir num horário mas consome no outro”, observa Menel, da Abiape.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) realizou um projeto piloto de resposta da demanda para indústrias no Nordeste em 2018. Não houve grande adesão, mas espera-se que a iniciativa possa ser reformulada.