Os subsídios que vão acabar no ano que vem foram criados em 2006 para impulsionar e incentivar o desenvolvimento das fontes renováveis. Trata-se de um desconto de 50% nas tarifas de uso do sistema de transmissão (Tust) e de distribuição (Tusd), bancado pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e repassado para todos os brasileiros. A partir de março de 2022, os novos projetos autorizados não terão mais esse desconto, conforme a MP transformada na Lei 14.120 neste ano. Por conta disso, os números de pedidos outorga após a publicação da MP 998, em setembro do ano passado, mais que dobrou em relação ao período anterior, como mostram os dados da Aneel.
De janeiro a agosto de 2020, os pedidos eram de 931 projetos, equivalentes a 41 mil MW. A partir de setembro, após a publicação da MP 998, os pedidos subiram para 1.886 empreendimentos, aumentando a capacidade para 85 mil MW. Segundo a Aneel, esse volume de energia é praticamente a mesma potência dos pedidos emitidos entre os anos de 2015 e 2019, de 90 mil MW. No caso das eólicas, o número de projetos aumentou 184% e o de solares, 76%, com capacidade de 27 mil MW e 57 mil MW, respectivamente.
“Não acredito que a mudança vá desestimular novos investimentos. O que vai ocorrer é que a régua estará em outro patamar”, diz a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Gannoum. Além disso, diz ela, desde 2013 os leilões são feitos por fonte de energia. “Em tese, esse modelo de contratação já elimina a necessidade de subsídio.”
Sem considerar os pedidos de outorga na Aneel, há cerca de R$ 24 bilhões em projetos eólicos em construção e outros R$ 48,5 bilhões já contratados. Ou seja, são pelo menos R$ 72 bilhões de investimentos nos próximos anos. Além disso, a energia eólica teve um grande salto nos últimos anos, saindo de 1.524 MW para 18.620 MW neste ano.
“A eólica teve um forte crescimento nos últimos dez anos, mas a expansão nos próximos dez anos será ainda mais expressiva”, diz Elbia, destacando que hoje a fonte já representa 10,6% da matriz elétrica brasileira.
O avanço é resultado de investimentos bilionários em novos parques eólicos espalhados pelo País, sobretudo no Nordeste. Entre 2011 e 2020, foram injetados no setor US$ 35,8 bilhões (R$ 189 bilhões pelo dólar de ontem). E o número não deve parar por aí, no caso da energia solar (1,8% da matriz), a potência instalada – que inclui grandes usinas e a microgeração – subiu de 93 MW, em 2016, para 8.813 MW em abril deste ano, resultado de R$ 46 bilhões de investimentos. Só para este ano, a previsão da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) é que o setor receba cerca de R$ 22 bilhões de novos investimentos.
Sobre o fim dos subsídios, o presidente da associação, Rodrigo Sauaia, afirma que ainda não é possível saber se o apetite dos investidores continuará no mesmo nível de agora. “Isso porque dependerá de regulamentação da lei e de alguns benefícios criados para as fontes renováveis”, diz ele, referindo-se aos ganhos ambientais. Ele destaca ainda que o setor aguarda votação de um projeto de lei que vai definir sobre cobranças na geração de quem tem painéis solares em casa, indústrias ou residências. “Dependendo do que for definido, nesse caso pode, sim, comprometer os investimentos.”
O professor da UFRJ Nivalde de Castro, coordenador geral do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), discorda. Para ele, não faz o menor sentindo manter esse subsídio cruzado. “Se quem coloca o painel em casa não paga pelo uso da rede, os demais consumidores terão de pagar por ele.” Para Castro, as fontes eólicas e solares continuarão atraindo investidores, já que são as fontes mais competitivas do mercado.
Para especialistas, a tendência é que a expansão das eólicas ocorra por meio de novos modelos. A sócia da KPMG Cristiane Azevedo conta que, atualmente, os investidores têm se interessado por modelos híbridos que envolvem a energia eólica e solar num mesmo espaço. “Esse tipo de projeto dá uma eficiência maior, já que produz tanto durante o dia como à noite.”
A presidente da Abeeólica confirma a tendência e diz que a Aneel colocou em consulta pública nova regulamentação para esse tipo de projeto. Hoje, explica ela, cada fonte exige uma rede de transmissão específica. Com a regulamentação, poderia usar a mesma, promovendo ganhos de escala e escopo.